Reconhecido pelo governo, queijo ainda precisa de regulamentação sanitária
A Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater), empresa pública, vinculada à Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa), está pronta para orientar os produtores do Queijo Minas Artesanal de Casca Florida (QMACF). Nesta variedade de queijo há a predominância de fungos filamentosos da espécie Galactomyces geotrichum, popularmente nomeados de mofos ou bolores, permitidos durante o processo de maturação. O reconhecimento do produto aconteceu no final de dezembro último, por meio da Resolução nº 42, publicada no Diário Oficial do Estado.
Os técnicos da Emater-MG continuarão a trabalhar as Boas Práticas Agropecuárias (BPA) e Boas Práticas de Fabricação (BPF), essenciais para a produção de um Queijo Minas Artesanal de boa qualidade, a exemplo do que já faz há anos com o Queijo Minas Artesanal de casca lisa ou casca lavada. Após a publicação de regulamento com as normas para a produção, a Empresa Mineira de Assistência Técnica e Extensão Rural orientará suas ações, buscando atender as regras sanitárias, nos casos em que o produtor já produz ou tenha interesse em iniciar na atividade.
“O apoio da Emater-MG abrangerá boas práticas de produção higiênica do leite, sanidade do rebanho, entre outras práticas agropecuárias, como também higienização da queijaria, higiene dos manipuladores, e todos os outros cuidados das boas práticas de fabricação. Também orientará o produtor na estrutura de queijaria e curral, exigidos pela legislação”, explicou a engenheira de Alimentos da Emater-MG, Fernanda Quadros.
Regulamentação
A decisão do governo estadual tornou Minas Gerais o primeiro estado brasileiro a reconhecer esse tipo de queijo artesanal, no país. Mas ainda falta a regulamentação do produto pelo órgão de inspeção sanitária do Estado, o Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA). O Superintendente de Abastecimento e Cooperativismo da Seapa, Gilson Sales, explica que a ainda não há previsão para a regulamentação do QMA de casca florida, mas outro passo já foi dado, nesta direção. O IMA formou uma comissão para tratar das normas de produção.
Sales ressaltou a participação da Emater-MG na força-tarefa, criada para o reconhecimento oficial da existência da iguaria mineira. “A Emater-MG fez o acompanhamento e a coleta dos queijos para o estudo de pesquisa das universidades. Quando sair o regulamento de produção, a empresa tem toda a condição de fazer o trabalho de orientação das regras. Esse já é um trabalho que ela faz há vários anos com o Queijo Minas Artesanal, de forma espetacular”, salientou.
Produtores
O produtor Moisés Antônio Barbosa, do município do Serro, no Alto Jequitinhonha, comemorou o reconhecimento do QMA de casca florida, que produz há 11 anos, depois de perceber um aumento da demanda pela espécie, na região. “Foi muito importante o reconhecimento do queijo, porque ele ganhou uma identidade. Antes era como se não existisse, agora o Casca Florida nasceu”, disse.
Barbosa, que também produz o QMA de casca lisa há 16 anos, afirma que vende 95% do Casca Florida e somente 5% do casca lisa ou lavada. Batizados de Queijo Ouro Fino, por serem produzidos na propriedade rural de mesmo nome, os dois produtos já ganharam vários concursos municipais e dois estaduais na categoria Ouro, em Tiradentes e categoria Prata, em São Roque de Minas. Quatrocentos quilos de queijos são comercializados, por mês, em Belo Horizonte, Curvelo, Serro e no estado do Espírito Santo, de acordo o fabricante.
O queijeiro Ivair José de Oliveira também festejou o reconhecimento do QMACF. Ele entrou na atividade em 2016 e hoje se dedica exclusivamente à confecção diária de 35 peças deste tipo artesanal. “Desde que começamos a produzir esse queijo, o primeiro da Canastra a entrar no mercado, pedimos pelo reconhecimento. Foi resultado de muita luta”, argumentou.
Segundo o produtor de São Roque de Minas, o “Queijo do Ivair” foi contemplado com 17 premiações, sendo seis delas em prêmios de concursos internacionais. Entre elas, duas competições consecutivas na França, na categoria Super Ouro. Antes de optar somente pela produção da linha casca florida, Ivair produziu o casca lisa de 2013 a 2016.
Pesquisa
O reconhecimento do QMA de Casca Florida se baseou em resultados de duas pesquisas separadas: uma feita pela Universidade Federal de Lavras (Ufla). A outra pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Essa última contou com a participação da Seapa, Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg) e Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) para a coleta de QMA Casca Florida, em diferentes microrregiões do estado.
“Coletamos amostras em diferentes fazendas, por cerca de quatro meses e identificamos diferentes fungos nos queijos. Entre os identificados se destacou o Galactomyces geotrichum. Na maioria dos queijos este foi o fungo dominante em todas as microrregiões estudadas”, explicou o professor do Departamento de Microbiologia da UFMG, Luiz Henrique Rosa.
Doutor em Microbiologia, com atuação na área de Micologia, especialmente na taxonomia e biotecnologia de fungos de diferentes ambientes do planeta, Rosa apontou como quase zero, os riscos para a saúde do consumidor deste tipo de queijo, mas chamou a atenção para a importância das boas práticas de fabricação.
“O Galactomyces geotrichum encontrado como dominante nos QMACF não possui relatos de causar doença grave em animais e humanos. Geralmente, poucos fungos são capazes de causar doença em humanos, desde que eles estejam com seu sistema imunológico em ordem e funcionando normalmente”, destacou.
Por isso, ainda segundo o pesquisador da UFMG, esse fungo representa um excelente candidato para inoculação controlada no Queijo Minas Artesanal e, em conjunto com medidas de boas práticas de fabricação, melhorar a segurança alimentar desse valioso produto artesanal de Minas Gerais.
Minas Gerais tem dez regiões caracterizadas como produtoras de Queijo Minas Artesanal. São elas: Araxá, Canastra. Campos das Vertentes, Cerrado, Serra do Salitre, Serro, Triângulo Mineiro, Serras da Ibitipoca, Diamantina e Entre Serras da Piedade ao Caraça.
Para a equipe técnica da Emater-MG, que atua na área de QMA, o reconhecimento do QMACF foi um passo importante, uma vez que a produção, comercialização e consumo deste tipo de queijo já vem acontecendo há algum tempo e defendem sua regulamentação.
“A produção deste queijo, baseada em estudos técnicos que caracterizem e comprovem a segurança do consumo do QMACF, permite que os produtores possam produzir e comercializar um produto regularizado, no aspecto sanitário. Isso vai dar segurança à população para consumir sem preocupações com danos à saúde”, segundo a engenheira de Alimentos da Emater-MG, Fernanda Quadros.